Nem todo mundo enxerga a mesma cor em um vestido. Nem todos veem o gato caminhando na mesma direção. As imagens que, nos últimos tempos, chamaram a atenção do público por ser interpretadas de diferentes maneiras são mais uma prova disso.
E é justamente essa diferença de olhar que resulta, muitas vezes, em grandes ideias. Pessoas enxergam uma oportunidade onde ninguém viu ou encontram novos caminhos em ideias já desenvolvidas, mas que podem, ainda, ser desdobradas.
No mundo do empreendedorismo, “pensar fora da caixa”, olhar por outros ângulos e arriscar em caminhos ou ideias que outros consideram malucas ou inviáveis é fundamental.
“Obviamente, qualquer empreendedor pode começar um negócio com uma fórmula pronta, mas nessas abordagens inovadoras é que se tem muito mais chance de crescimento”, diz Yuri Gitahy, especialista em empreendedorismo e inovação.
Há um risco iminente em optar por uma trilha ainda não explorada. No entanto, ao analisarmos histórias de empreendedores de sucesso e de ideias que deram muito certo fica claro que para chegar lá é preciso arriscar. E, talvez, correr riscos realmente não seja um problema para os empreendedores natos.
Em seu livro Rápido e Devagar − Duas Formas de Pensar, o autor Daniel Kahneman, um psicólogo israelense e Nobel de Economia, conclui que os empreendedores realmente pensam diferentemente. Eles fazem parte do grupo dos “otimistas irracionais”. Segundo ele, essas são pessoas que estão dispostas a correr muitos riscos, pois possuem uma fé inabalável em suas habilidades.
E foi apostando em ideias pelas quais ninguém “dava nada” e arriscando-se ao fracasso que os empreendedores criaram os produtos, abaixo, que hoje são sucessos absolutos.
No fim dos anos 1990 e começo dos anos 2000, os grandes selos de música e entretenimento enfrentavam a batalha contra os downloads gratuitos e ilegais de música na internet.
Nessa época, as gravadoras eram contra a propagação do mp3. Um dos primeiros tocadores de mp3 no mercado, o Rio, da coreana Diamond Multimedia, só conseguiu ser lançado porque a RIAA (sigla em inglês para a Associação da Indústria de Gravadores dos Estados Unidos) abandonou o processo contra a empresa.
Em um cenário no qual todas as iniciativas voltadas para a música digital pareciam estar destinadas ao fracasso, Steve Jobs, CEO da Apple, falecido em 2011, viu uma oportunidade para revolucionar o mercado.
Ao perceber que a demanda para consumir música online existia e crescia, apesar das tentativas das grandes gravadoras de bloqueá-la, Jobs reuniu essas empresas para oferecer um serviço diferenciado: vender músicas individuais por 0,99 centavos de dólar. Assim, poderiam satisfazer o público que gosta de baixar músicas sem deixar de ganhar suas participações.
Apesar do estranhamento inicial das gravadoras, a ideia foi comprada e ajudou a consolidar o iTunes como a maior plataforma de venda de música nos Estados Unidos – representando 69% do mercado de música digital.
No ano de 2013, em razão dos dez anos do iTunes como serviço, a Apple divulgou que durante esse período foram baixados mais de 25 bilhões de músicas.
A Netflix é mais conhecida no Brasil por seu serviço de streaming, mas, na verdade, a companhia – que existe desde 1997 – foi fundada com o objetivo de ser uma locadora de vídeos online, na qual as pessoas alugavam pelo site e recebiam os filmes locados pelo correio.
A ideia veio quando Reed Hastings, um dos fundadores da empresa, devolveu um filme com atraso na locadora, pagando uma multa de 40 doláres. Depois disso, Hastings pensou que deveria existir um modelo de locação que não se baseasse nas multas altas para garantir o retorno do produto.
Em entrevista ao Silicon Valley Business Journal, outro fundador do Netflix, Marc Randolph, conta que ao perceber que as pessoas mais compravam do que alugavam filmes, veio mais uma ideia: mudar o modelo de negócio. Por quê?
Bom, porque os sócios-fundadores sabiam que não teriam como competir quando as grandes lojas, como a Walmart, entrassem no mercado de venda de DVDs. Então, a decisão foi “forçar” os consumidores a alugar os filmes.
Foi assim que, em 2007, dez anos depois de sua fundação, o Netflix deu mais um passo ambicioso: começou o streaming de filmes, em uma época na qual ainda se investia muito em mídias físicas, como o DVD e o Blu-Ray.
A estratégia arriscada, e que na época parecia maluca, permitiu que o Netflix não entrasse em confronto direto com grandes varejistas e conseguisse firmar um serviço que, por muitos anos, permaneceu único.
Apesar do estranhamento inicial do mercado, o Netflix alcançou, no começo de 2015, a marca de 57,4 milhões de assinantes em todo o mundo.
Na década de 1990, o número de usuários de internet nos EUA crescia rapidamente, cerca de 2,3% ao ano. Uma porcentagem bastante expressiva para a época. E Jeff Bezos viu que ali havia uma mina de ouro ainda a ser explorada.
Bezos, que até então era um alto executivo em um banco de investimentos de Wall Street, resolveu largar tudo para montar uma livraria virtual em seu quintal. O que pode parecer loucura se tornou a fama e a fortuna do magnata americano.
Em 1995, ele lançou o e-commerce de livros Amazon, que foi para o ar com um milhão de títulos disponíveis. O foco de Bezos era oferecer um serviço 24 horas com um catálogo gigantesco e muitas opções de entrega. Em menos de três meses, o site já vendia 20 mil dólares por semana. Quase um ano depois, a receita anual da Amazon era de 16 milhões de dólares.
A Amazon começou a comercializar CDs, DVDs, fitas e videogames ainda nos anos 1990, mas foi nos anos 2000 que Bezos deu seu outro grande passo. Com o lançamento e o sucesso do iPod, Bezos percebeu que um “iPod de livros” poderia também dominar o mercado. Por isso, ele investiu no Kindle e no comércio de livros eletrônicos. Em 2010, a Amazon já era responsável por 59% do mercado de e-readers no mundo.
E Jeff é daqueles que estão constantemente mais “fora” do que “dentro” da caixa. É por isso que, de tempos em tempos, a Amazon apresenta novidades, como entregas antecipadas e uso de drones.
Este caso brasileiro mostra que não são só grandes empresários, com grandes ideias, que pensam fora da caixa. Inovar e correr riscos faz parte do DNA do empreendedor e, se ele der asas à imaginação, pode encontrar caminhos alternativos, independentemente do porte do seu negócio.
A agência Esperienza surgiu em 2003 para oferecer soluções de web a shopping centers. Cassiano Antequeira, diretor da agência, afirma que a experiência de ter trabalhado em shoppings foi o que deu a ideia para a agência: “percebi que era um mercado inexplorado”, diz.
No começo, o serviço era focado na construção de sites para shoppings, mas Cassiano ainda não estava satisfeito com seu negócio. Sabia que precisava ir além dos sites. “A criação de sites estava se transformando em commodity, então tínhamos de inovar no nosso serviço”, conta Cassiano.
A grande ideia veio, então, quando ele ampliou sua visão. Passou a olhar não a relação cliente-shopping, mas sim a relação lojista-shopping.
“Um shopping center é como uma cidade. Às vezes, o consumidor não tem ideia da infraestrutura e burocracia necessária para manter tudo funcionando dentro de um shopping”, explica o empresário.
Assim surgiu o conceito da Intranet Mall, que oferece aos clientes um sistema de integração entre as lojas e a administração do shopping, que permite gerenciar processos de vendas, envio de informativos e fazer solicitações e aprovações.
Atualmente, a empresa atende 6 mil lojistas em 45 shoppings espalhados pelo Brasil, mas os planos de crescimento são ambiciosos. “Pretendemos chegar a 100 shoppings até o fim de 2015”, diz Cassiano.
Essas histórias mostram que para empreender é preciso olhar por outros prismas. A boa ideia nem sempre está na linha reta, pode estar em uma curva ou escondida em algum atalho. É preciso seguir os instintos e arriscar sem medo de errar.